Idéias sem ponto II (O retorno)

Filosofar é coisa de adulto? Nem sempre. “Crianças podem e devem filosofar para começar a ver e entender o mundo em que vivem. A filosofia é uma ferramenta fundamental para elas”, é o que afirma Marcelo José Fernandes, diretor do colégio Santa Teresa D´Àvila, o primeiro em Petrópolis a adotar a filosofia no currículo das séries iniciais.
Toda semana durante trinta minutos as crianças do C.A. e da 1ª série da escola tem uma leve e descontraída conversa. A partir de histórias contadas pela professora Lara Sayão, os “pequenininhos” são levados ao mundo da filosofia. “Abordamos temas relacionados ao pensamento filosófico, utilizando pequenas histórias, que os fazem questionar as coisas que conversamos, enquanto introduzo pensamentos e idéias referenciais da filosofia”, diz a professora.
Nas aulas não se força o aluno a decorar nomes, datas, que na maioria das vezes nem são citados, a intenção do projeto é que eles aprendam a elaborar questões e estimulem seu pensamento crítico.
A filosofia como disciplina está presente no Santa Teresa D`Ávila desde sua fundação em 2002, mas era restrita ao Ensino Médio. No começo desse ano, com a implantação das turmas de Educação Infantil e Ensino Fundamental, a idéia inovadora em Petrópolis foi adotada. “A filosofia é muito mais que uma disciplina, porque antes que obrigatória, ela é necessária para formação do ser humano”, explica o diretor da escola.
A professora Lara afirma também que a adoção da disciplina corrigiria deficiências no sistema educacional. “Infelizmente ainda existem alguns alunos que chegam na faculdade com dificuldades em raciocinar logicamente, ler, entender alguns temas, analisar criticamente o que é dado em sala de aula. E é exatamente isso que estimulamos nos nossos alunos”, afirma.
Um mundo melhor...
A construção de um mundo diferente do que vivemos não deixa de ser um objetivo do projeto. “Até os dias de hoje, vemos um ensino baseado na reprodução do conhecimento nas escolas, isso acaba gerando uma reprodução da desigualdade social. Fazendo os nossos jovens criticar a isso, daremos oportunidades para que eles escrevam um futuro diferente”, garante a professora.
Uma preocupação da direção foi a recepção da filosofia por parte de pais e alunos. “Corríamos um grande risco, por ser uma disciplina pouco palpável como a matemática, o português. Mas, em nenhum momento houve resistência, seja de outros colegas, pais ou alunos”, disse Marcelo.
Até situações engraçadas surgiram depois que os pequenos passaram a se aventurar com a filosofia. “Recentemente, um aluno chegou em casa e perguntou a mãe como ela sabia que a cadeira era mesmo uma cadeira, utilizando, mesmo sem saber, o princípio de percepção de conceitos”, diverte-se o diretor.
Olhares atentos...
Interrogação? Nenhuma. O que se via nos olhos das crianças da tia Lara era atenção. A aula de trinta minutos flui de forma impressionante. O tema que para alguns pode parecer monótono, para as crianças é motivo de descoberta. A pequena Zayra Carin Alves da Silveira se diverte e, como seus colegas, dá palpite em tudo o que a professora fala. “Tia eu queria que fosse possível construir um transportador de casa para que eu levasse a minha casa para todos os lugares onde eu fosse”, fala com autoridade na aula sobre o que é possível e o que não é possível. Já um de seus amiguinhos de turma afirma. “Eu queria que fosse possível existir uma máquina para acabar com a guerra”. E assim corre a aula de filosofia para as crianças do C.A e da 1º série, sempre com perguntas, sonhos e muitas novas descobertas.

Desde o dia 7 de julho o ensino de filosofia e de sociologia passaram a ser obrigatórios para o ensino médio. A resolução que foi aprovada por unanimidade no Conselho Nacional de Educação (CNE).
A medida, válida para todo o território nacional, prevê prazo de um ano para que os Estados incluam as duas disciplinas na grade curricular. Antes da aprovação no CNE, 17 Estados já adotavam essa prática.